A alegoria da caverna continua a ser actual, o homem continua iludido, a nascer cego, inocente, agrilhoado e ignorante. O Homem continua a acreditar no óbvio, nas sombras, nas imagens pretensamente “reais” que são iguais para todos, continua a sentir-se bem com o seu escasso e falso saber. Quando alguém com um novo saber põe em causa o nosso, agimos como os prisioneiros, de forma rude, atrevida e ignorante.
Os velhos saberes dão-nos segurança, enquanto o novo saber exige trabalho. Para sair da caverna em que todos nascemos, precisamos de termos o gosto pelo saber, a capacidade para nos espantarmos e estarmos aptos para aprender e para caminhar em busca do saber ilimitado.
O caminho é íngreme, rude, cheio de obstáculos, doloroso, tem de ser feito lentamente, progressivamente, e ao longo deste caminho vamos aprendendo valores como a beleza, a justiça e virtude a verdade, que nos ajudam a alcançar o BEM. A aprendizagem é rigorosa e sempre renovada, pois o nosso pensamento está sempre a mudar. O caminho de aprendizagem só tem um sentido, uma vez percorrido é impossível regressar ao ponto de partida: a inconsciência da nossa ignorância.
Quando saímos da caverna percebemos que o Sol é a razão, e que sem ele viveríamos na escuridão do desconhecimento, compreendemos que as imagens, as ideias dominantes e os bens materiais que nos rodeiam são sombras e pensamentos que além de irreais e irrelevantes, só nos transmitiam uma falsa sensação de conforto e segurança.
Ao caminharmos em busca de um saber que nunca nos sacia totalmente, vemos o quanto a nossa sociedade está enganada, iludida, protegida por pensamentos, comportamentos duplicados e falsos, pensamentos que impedindo o espanto, nos levam à imitação irreflectida dos outros, construindo assim uma sociedade em que nos tornamos ovelhas que seguem um qualquer “mestre”, ovelhas que quando sozinhas e face a algo inovador, não sabem como pensar ou agir. Na sociedade cada um deve tentar criar a sua própria visão do mundo, na certeza de que nenhuma deles é completamente “real” e por isso, devemos continuar a fazer o esforço para “ver melhor”.
Mas a nossa sociedade tem como lema: “Eu sou mais se tiver mais”. No nosso dia-a-dia somos bombardeados com doses massivas de publicidade, que nos ilude e nos leva a um consumo disparatado e desnecessário. O homem tenta compensar a falta de tempo para pensar, para conviver em sociedade, a falta de inteligência para bem viver, comprando toda a espécie de bens. A sociedade não parece interessar-se particularmente pela capacidade de pensar e agir, pela capacidade de aprendizagem ou pela inteligência, mas sim pela quantidade e tamanho de bens que cada pessoa tem ou pode ter.
Como bem referia o Dalai Lama, o homem passa dois terços da sua vida a estragar a sua saúde para ganhar dinheiro, e um terço da sua vida a gastar o dinheiro que ganhou para recuperar a saúde que perdeu. É absurdo que as pessoas pensem que para se “ser alguém”, se tenha a ingenuidade de que vivemos sempre, com um tipo de vida que nos leva a arranjar doenças, e que nos faz arrepender quando reparamos que é tarde demais, já só querendo prolongar o tempo de vida e recuperar o tempo perdido. Nós somos aquilo que pensamos e fazemos, não aquilo que vestimos e possuímos.
Na Alegoria da Caverna e no filme “The Truman Show” os protagonistas, os prisioneiros, vivem iludidos com uma vida/realidade que lhes foi criada, têm uma atitude baseada na ignorância, e quando começam a perceber que existe um caminho que os leva à luz da razão, tentam percorrê-lo, apesar das dificuldades e obstáculos que os põem sempre à prova.
Truman, depois de muito olhar à sua volta, acaba por reparar que o seu mundo é demasiado controlado, rotineiro, quando alguma coisa sai da rotina, o seu mundo, programado ao pormenor, é imediatamente “reparado”. Truman, vai descobrindo à sua volta o mundo das “sombras” existentes e programadas por um “mestre”. Truman apercebe-se de que a sua vida não é “sua”, que ele não depende das suas ideias, princípios e pensamentos, o que o leva a iniciar a sua viagem pessoal de procura da liberdade e da razão. Durante o caminho é confrontado com várias perplexidades, pois “Truman nunca viveu, não tem pensamentos, não sabe como é a vida”, mas mesmo assim, tem coragem para prosseguir na busca da verdadeira “realidade”.
Truman, tal como os prisioneiros da Alegoria da Caverna, representam a atitude do aprendiz de filósofo, que vive no mundo de sombras e que aos poucos vai ganhando capacidade de se espantar e de procurar respostas para as perguntas que faz a si mesmo, sendo por isso obrigado a tomar uma decisão: “Caminhar em busca do saber – mesmo sem a compreensão da sociedade a que pertencia - ou ser derrotado pela submissão ao velho e rotineiro saber”.
A meu ver o “The Truman Show” é uma excelente representação do nosso mundo real. Todos nós somos o Truman, aceitamos ter a nossa vida controlada, não só por um “mestre”, mas por vários, os nossos pais, os políticos, os jornalistas, os nossos amigos.
O Homem deve que ter noção do que é, a consciência do mundo que o rodeia. Sim, eu também sou “Truman”, e por isso não quero ser mais uma “ovelha” numa sociedade de “ovelhas”, e por isso me disponho abdicar do enganador conforto e segurança da rotina e ganhar capacidade para me espantar e a coragem para iniciar o sempre difícil caminho de busca do saber e da aprendizagem. Proponho-me continuar a mudar e melhorar o meu conhecimento e candidatar-me aos ensinamentos da escola de Platão.
Ana Rita Monteiro – 10º6