A exposição bibliográfica e documental intitulada 70 Anos de Formação em Inglês-Alemão, que teve lugar na nossa Escola, na Sala Leitão de Figueiredo, em Junho de 2006, integrava uma secção de materiais relativos ao período de formação inicial de docentes em Inglês, que decorreu sob a minha orientação pedagógica, de 1988 a 2004, com um ano apenas de interrupção. Dei a essa secção o título 15 Anos de Formação em Inglês - «Manuais» e Planos de Aula.
Aquilo que designei por «manuais» são alguns livros (45) donde extraí, ao longo destes anos, os textos que serviram de base para as minhas aulas e estiveram sempre, esses e muitos outros, à disposição das/os formandas/os. Uns são clássicos da literatura em língua inglesa, outros descobertas pessoais mais recentes, ou resultado da troca de materiais entre colegas e no núcleo de estágio.
Juntamente com diversos livros, revistas e jornais, dos quais saliento o Guardian Weekly e o New Internationalist, reproduções de obras de arte, filmes, documentários, peças de música, etc., eles constituíram os «manuais», substituindo os adoptados, num trabalho de acompanhamento crítico dos programas, preconizado pela Área de Estudos Anglo-Americanos da FLUC e por mim apoiado.
Foi rápida a selecção dos «manuais» para a exposição; mais difícil a selecção da selecção dos planos de aula. Era demasiado comovente re-ver o trajecto de pesquisa, preparação, acompanhamento, planificação e avaliação de tanta aula, remexer em tanto trabalho, reviver tantas emoções e, ainda hoje, me interrogar sobre se proporcionei a melhor preparação possível. É cedo para proceder a tal reflexão. Precisava de fazer novas leituras, recolher testemunhos, perceber em que caminho estão, que ideias fecundaram, até que ponto é que o estágio lhes foi útil e memorável. Tranquilizou-me pelo menos ouvir a Luísa Pires, professora estagiária no ano lectivo de 1999-2000, presente na Mesa-Redonda sobre 70 Anos de Formação em Inglês- Alemão, lembrar uma observação que fiz ao grupo no fim do estágio: «O estágio começa agora!»
Ah! Tinha-as/os felizmente alertado para a realidade que iriam enfrentar: depois do estágio e ao longo de toda a vida profissional há muito para aprender. O seu desenvolvimento profissional estava agora nas suas mãos.
Hoje, aqui, prefiro falar do «meu estágio», ou seja, da minha tarefa de orientadora, apenas em termos de perdas e ganhos pessoais. O que perdi com a orientação? O que ganhei?
De todas as perdas e ganhos deixem-me salientar só dois aspectos. Perdi alguma espontaneidade nas aulas, como se a responsabilidade do papel que exercia me obrigasse a uma perfeição de desempenho profissional modelar, que em certa medida me espartilhava, embora, felizmente, nunca tivesse perdido o meu estilo pessoal. Lembro-me com saudades do tempo em que era apenas professora, e da proximidade que criava com as turmas que acompanhava ao longo e dos anos e dos projectos que com elas desenvolvia. Preparar uma turma, cedê-la para regências e recuperá-la num só ano, é estranhamente um acto de partilha e perda dolorosa, pois a turma nunca vem inteira. Algo ficou já pelo caminho!
Paradoxalmente o que mais ganhei foi a liberdade que a orientação pedagógica nos confere. Por exemplo, a liberdade de substituição do manual, com selecção pessoal de materiais alternativos, fomentada pela entidade supervisora do estágio de Inglês como experiência de formação. O exemplo deve vir de cima e eu não me fazia rogada…Tinha o cuidado de remeter a
turma para o manual, usando-o de vez em quando e com reservas, como fonte de informação e prática para trabalho de casa.
Mas o uso de bons materiais, como já disse noutro lugar, é viciante, e, em pouco tempo, é a própria turma que reclama o uso de textos interessantes e de qualidade a que se habituou. Não me recordo, desde que pus em prática essa liberdade, de alguma vez me ter sentido aborrecida numa aula ou de ter notado aborrecimento pela parte dos/as alunos/as. Pelo contrário, lembro-me do gozo da preparação, do desafio da folha em branco e de todo o trabalho até à construção definitiva dos materiais. Lembro-me de alunas/os, por vezes para espanto de si próprios, inesperadamente, a desbravar e a ligar sentidos, e a ligarem-se aos sentidos crítica e afectivamente. E eu contente por lhes deixar nomes, referências, pistas de comunicação e solidariedade com o mundo. E elas/eles contentes porque o poço era fundo mas todos bebiam da sua água!
As aulas passavam depressa demais e não chegavam para os textos maravilhosos que havia para dar. E as regências roubavam aulas. Eu cedia textos. Ou guardava textos! Mas por vezes o tempo não chegava e um texto ficava por dar.
Se algo me dói na aposentação é a aula não dada, a voz não ouvida.
professora do 9º Grupo - A